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OBS.: O artigo abaixo foi publicado originalmente em maio de 2000. Há pouco mais de uma década, a Microsoft sofria uma série de ações judiciais movidas por governos e outras empresas, as quais acusavam a gigante da informática de práticas anticoncorrenciais. O texto expõe os erros contidos nas chamadas leis de defesa da concorrência (ou antitruste) e na própria concepção teórica que fundamenta essas leis. De forma indireta, também apresenta as diferentes abordagens que a Escola Austríaca e a Escola de Chicago têm sobre concorrência e propriedade privada.
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O atual debate sobre o caso Microsoft tem causado (novamente) divisão entre os economistas, mesmo entre aqueles que se julgam economistas pró livre mercado.
De um lado do campo do livre mercado estão os Austríacos e seus seguidores, os quais acreditam que leis antitrustes não têm papel algum em nossa economia, portanto, devendo ser banidas dos livros.
Do outro lado, entretanto, estão os economistas da Escola de Chicago, que parecem estar divididos em suas opiniões a respeito da Microsoft, mas concordam que deve haver algum papel para a legislação antitruste no sentido de manter as firmas "honestas".
Então temos Robert Bork, autor do livro The Antitrust Paradox, um livro que discorda bastante do ponto de vista padrão pró-antitruste, agora sendo um porta-voz pago pela rival da Microsoft, Netscape. Desde então Bork tem endossado um velho estilo de “remédio” antitruste, pedindo a dissolução da combatida gigante do software. Outros economistas da Escola de Chicago não estão convencidos, apesar de parecerem manter a visão de regras antitruste como “último recurso”.
Consideremos Thomas Sowell, por exemplo, que recebeu seu doutorado em economia em Chicago e mais tarde ensinou na Universidade da Califórnia, ensino esse baseado num profundo programa orientado pelos princípios da escola de Chicago. Ele condenou reiteradamente a decisão da Microsoft e as tentativas do Departamento de Justiça para desmembrar a empresa.
No entanto, Sowell não condenou as várias leis antitrustes, as verdadeiras culpadas, apesar de ter chegado perto dessa reprovação em suas últimas colunas.
Existem boas razões para que os Austríacos se oponham as leis antitrustes. Não só elas são propositadamente vagas, mas representam uma agressão clara do governo sobre a propriedade privada. As leis antitrustes operam da mesma forma que as leis econômicas operaram durante a década de 30 na Itália fascista e na Alemanha : elas permitem uma nacionalização de facto da empresa privada sem que o governo seja, de direito, o proprietário.
Ludwig von Mises e Murray Rothbard da Escola Austríaca apontaram de forma enfática que a propriedade privada é essencial para o funcionamento de uma economia. Como Mises observou em sua discussão sobre o socialismo, a propriedade privada (livre de governo) dos fatores de produção é necessária para a possibilidade do cálculo econômico. Sem esse cálculo, escreveu Mises, a economia cairia num caos, algo que foi eloqüentemente confirmado em diversos regimes socialistas na maior parte do século 20.
A propriedade privada como instituição necessária à eficiência econômica separa os Austríacos das outras escolas de pensamento, incluindo a Escola de Chicago. As outras facções defendem que a eficiência econômica é simplesmente uma questão de igualar preços ao custo marginal. De acordo com suas doutrinas, qualquer empresa que cobra um preço diferente do custo marginal cria uma "falha de mercado” que não pode ser sanada pelo mercado. Assim, o governo deve intervir para corrigir essa aberração.
Os Austríacos, por outro lado, acreditam que tal noção é pura loucura. A idéia de que alguém no governo - ou mesmo na iniciativa privada - possa saber o "custo marginal” de uma firma particular, em qualquer estágio de produção, é um exercício de auto-ilusão, pois exigiria uma onisciência que ninguém possui.
Este abismo entre os Austríacos e as outras escolas do pensamento econômico é destacado por uma série de outras diferenças. Os Austríacos vêem a concorrência de mercado como um processo, enquanto outros vêem a concorrência como vários estados estáticos que vão desde a concorrência perfeita ao monopólio. O ponto de vista Neomarshalliano de concorrência sustenta que o estado natural das relações econômicas é um inevitável movimento da concorrência ao monopólio. Em outras palavras, a menos que o governo intervenha, há uma tendência de mercados competitivos, ao longo do tempo, saírem de estados de pura competição para estados em que as empresas possuam puros privilégios de monopólio.
Os Austríacos, no entanto, adotam uma abordagem diferente. Eles constatam freqüentemente que nos estágios iniciais de produção, relativamente poucas empresas produzem bens e serviços. Como estas empresas ganham lucros econômicos, no entanto, os empresários tentam aproveitar novas oportunidades de lucro.
Como a produção continua e o mercado potencial para o bem ou serviço particular cresce, as empresas tendem a se fundir. Isso não é necessariamente um sinal de diminuição da concorrência, afirmam os Austríacos. Em vez disso, eles observam que a única maneira de uma empresa expandir as suas operações - sem a ajuda do governo - é produzir algo que agrada a um grande número de clientes, o que Mises chamou de "soberania do consumidor".
Portanto, os Austríacos vêem o crescimento da Standard Oil Company de John D. Rockefeller como sendo o resultado da capacidade da empresa em oferecer aos clientes um bom produto a um preço baixo, e não o contrário. Como os Austríacos e outros defensores de Rockefeller notaram, o crescimento da Standard Oil Company coincidiu com melhores serviços e preços mais baixos para os consumidores.
As diferenças entre os dois campos teóricos são fundamentais e mutuamente excludentes. Por um lado, os Austríacos não estão limitados pelos modelos neomarshallianos suavizados , contínuos, com curvas de custo em forma de U, e que pressupõem que as empresas conhecem o custo marginal e a receita marginal de cada unidade produzida. Estes modelos, afirmam os Austríacos, no melhor caso são grosseiros e no pior, enganosos. Ao mesmo tempo em que esses modelos podem funcionar como boas ferramentas pedagógicas em sala de aula (e nos tribunais), eles são utilizados pelos governos no controle das relações empresariais.
Na verdade, o uso destes modelos consolidou as diferenças entre Mises e Oskar Lange no Debate do Cálculo Socialista de 1930. Lange afirmava que o governo poderia usar os modelos Neomarshallianos para definir preços e produção, já que os custos eram objetivamente obtidos e as informações necessárias para a tomada de decisão eram automaticamente incorporadas nas curvas de custo.
Mises argumentava que o raciocínio de Lange era ridículo. Não só os fatores de mercado não poderiam operar sem a instituição real da propriedade privada, como também não haveria uma maneira das agências de planejamento socialista dirigirem as relações econômicas de um país usando modelos simples e grosseiros de sala de aula. Em 1939, Lange ganhou o elogio de seus pares, que o declararam "vencedor" do debate. Em 1990, a posição de Mises foi sustentada por eventos e fatos reais.
Compreender os limites dos modelos neoclássicos modernos é essencial para o entendimento do debate atual sobre a eficácia das leis antitruste e de "defesa da concorrência". Se o potencial explicativo desses modelos é fraco, então, atrelá-los a leis que usurpam a propriedade privada não é só contraproducente, mas também revela o verdadeiro sentido e utilidade das poderosas garras do governo. O fato de economistas terem feito milhões de dólares atestando casos antitruste (e usando seus modelos grosseiros como suporte) também nos diz que alguns membros desta profissão estão fazendo mais do que promover a "eficiência econômica" altruisticamente.
Os economistas Austríacos por mais de um século têm dado explicações precisas para os fenômenos econômicos que temos observado. No caso da Microsoft, eles não caíram na armadilha de olhar para as circunstâncias particulares para ver se Bill Gates "infringiu a lei" ou não. Em vez disso, os Austríacos insistem que a legislação antitruste por si só é fatalmente falha. É hora de desafiar os paradigmas modernos neoclássicos sobre as quais repousam as leis antitrustes. Nas palavras de Mr. Bumble em Oliver Twist, de Charles Dickens, "Se essa é a lei meu senhor, então a lei é burra".
William L. Anderson é scholar adjunto do Mises Institute e ensina economia na Frostburg State University.
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Tradução de Tullio Bertini
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